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Cuidar não é favor: a divisão desigual da parentalidade

Artigo de opinião

Por: Geisa Peixoto

Outro dia, em uma conversa despretensiosa com uma amiga, ela me contou algo que me deixou inquieta. A filha dela está passando por dificuldades na escola com o comportamento alterado. A professora recomendou que a menina fizesse terapia. Até aí, tudo bem.


		Cuidar não é favor: a divisão desigual da parentalidade
Geisa Peixoto |. UniAraguaia


A reunião sobre a situação da criança contorno com a presença da mãe e do pai. Ambos ouviram, da mesma boca, a mesma orientação. Mas só um deles se responsabilizou: a mãe. Foi ela quem foi atrás da psicóloga, se desdobrou para encaixar horário, pediu liberação no trabalho. Foi ela quem se preocupou. E o pai? Nem sequer conversou com a filha. Quando a consulta finalmente foi marcada, sua única ocorrência foi o silêncio

Isso não é exceção. É rotina. E não, não é sobre maternidade ou instinto feminino. É sobre desigualdade estrutural na parentalidade. É sobre como homens ainda são autorizados socialmente a serem pais só no papel.

E mesmo eu, que não sou mãe e nem pretendo ser, consigo ver o desequilíbrio gritante nessa solução. O cuidado com os filhos não pode continuar sendo uma extensão automática da identidade feminina. Não é uma mulher que “tem que dar conta”. O cuidado não é um talento restrito apenas às mães. É uma responsabilidade de quem cria. E se você é pai, isso inclui você.

O que mais me assusta é a naturalização dessa omissão. O pai que “ajuda quando pode” é visto como bom. O que busca a filha na escola uma vez por semana ganha elogios. O que marca presença apenas nas fotos e nos aniversários é exaltado como participativo. Mas e o resto? E os boletos emocionais, o desgaste mental, a sobrecarga silenciosa que sobra para a mãe todos os dias?

Pai não ajuda. Pai tem (ou desvia ter) a responsabilidade de cuidar. A ausência constante do pai não é neutra. É deixar que o fardo pese só para alguém que também está cansada, também tem trabalho, também precisa respirar.

É hora de parar de romantizar o pai omisso. De deixar de lado esse discurso enraizado de “cada um tem seu jeito de cuidar”. Porque o jeito de alguns é simplesmente não cuidar. E isso não pode ser mais aceitável.

Se ser pai é só estar disponível quando convém, é melhor compensar o que significa essa palavra. Pai ausente é pai que falha. Falha com a criança, com a companheira e com a própria ideia de responsabilidade.

O cuidado precisa ser dividido. Porque criar filhos é coletivo, e carregar o peso sozinho não é maternidade heroica, é um esgotamento silencioso que não desvia mais ser normalizado.

Sobre a autora: Jornalista, social media e voluntária do Observatório do Direito das Mulheres da UniAraguaia.

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