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Governo aponta falta de verba para cumprir pisos de saúde e educação já em 2027

Desse valor, R$ 56,5 bilhões ficariam carimbados para emendas parlamentares

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O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) indicou que faltará verba no Orçamento para cumprir os pisos de saúde e educação já em 2027, em mais um indício do risco de insustentabilidade do arcabouço fiscal e de apagão nas políticas públicas.

As projeções do PLDO (projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2026 mostram que a reinclusão integral das despesas com sentenças judiciais nas regras fiscais deixaria um espaço de apenas R$ 122,2 bilhões para gastos discricionários (não obrigatórios) em 2027, primeiro ano de gestão do próximo presidente da República.

Desse valor, R$ 56,5 bilhões ficariam carimbados para emendas parlamentares. A sobra de R$ 65,7 bilhões, por sua vez, é insuficiente para honrar a complementação necessária para cumprir os pisos, estimada em R$ 76,6 bilhões.

O saldo negativo de R$ 10,9 bilhões é um sinalizador da gravidade do quadro, pois só depois de garantir as emendas e as aplicações mínimas em saúde e educação viriam as demais despesas não obrigatórias, como gastos para manter o funcionamento da máquina e investimentos em outras áreas. Não se trata de falta de dinheiro, mas sim de não ter espaço para executar as despesas seguindo as regras incorporadas à legislação para garantir a sustentabilidade fiscal e evitar o endividamento excessivo do país.

Nesta terça-feira, o secretário de Orçamento Federal, Clayton Montes, reconheceu que, sob as normas atuais, as políticas públicas ficariam comprometidas já a partir de 2027. "O valor [disponível] não comporta todas as necessidades do Poder Executivo", afirmou em entrevista coletiva realizada na terça-feira, 15.

Hoje, uma parcela das sentenças fica de fora do limite de despesas do arcabouço e da meta fiscal após acordo costurado pelo governo com o STF (Supremo Tribunal Federal), uma forma de regularizar os pagamentos que haviam sido adiados no governo de Jair Bolsonaro (PL). A exceção, porém, tem data para acabar e só vale até o fim de 2026.

A partir de 2027, o governo precisa reincluir essas despesas no arcabouço e na meta de resultado primário.

Técnicos do governo alertam, porém, que este não é um problema para o próximo presidente da República, mas sim para a atual gestão. Em agosto de 2026, às vésperas da campanha, o Executivo terá que enviar ao Congresso a proposta de Orçamento de 2027.

Problema semelhante foi vivido por Bolsonaro em 2022. Sem espaço para acomodar despesas já contratadas e promessas de campanha, Guedes enviou o PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) de 2023 com cortes em várias políticas públicas, como o programa Farmácia Popular, e sem recursos suficientes para bancar o Auxílio Brasil de R$ 600 por família.

Os cortes generalizados foram explorados por seus adversários na eleição, incluindo Lula -que, uma vez eleito, obteve apoio no Congresso Nacional para aprovar uma PEC (proposta de emenda à Constituição) para elevar o teto de gastos e descomprimir as despesas discricionárias.

Até agora, o governo ainda não deu uma sinalização concreta de como o problema será resolvido. Segundo Montes, as conversas ainda nem começaram.

"No momento não tem a discussão no que se refere à manutenção [da exceção] ou do envio de uma legislação [para propor uma nova regra para precatórios]", disse o secretário.

A secretária-adjunta do Tesouro Nacional, Viviane Varga, disse que as sentenças judiciais não estão em trajetória explosiva, mas reconheceu que o fim da exceção pactuada com o STF cria dificuldades e afirmou que o Executivo agirá para resolver a questão. "Não dá para olhar para essas projeções e imaginar que governo está de mãos amarradas. O governo trabalha a todo momento para entregar soluções."

Nesta quarta-feira (16), o ministro Fernando Haddad (Fazenda) reforçou que o governo ainda não abriu as conversas em torno do tema, mas afirmou que o problema precisará ser debatido inclusive com o Judiciário.

"Teve um salto muito grande no governo Bolsonaro. Quase dobrou o valor dos precatórios. Para um país que está precisando fazer um ajuste nas contas, é um desafio grande. São coisas novas, não existiam no passado recente. O volume de precatórios, o volume de emendas. Tem muitas coisas que precisam ser conversadas", disse a jornalistas no Rio de Janeiro.

No cenário fiscal traçado no PLDO de 2026, o governo ainda teria recursos suficientes para executar suas políticas no ano que vem. O espaço para as despesas discricionárias é calculado em R$ 208,3 bilhões, dos quais R$ 53 bilhões iriam para emendas parlamentares.

Outros R$ 72,2 bilhões seriam direcionados à complementação para os pisos de saúde e educação. Ainda restaria uma margem de R$ 83,1 bilhões para o Executivo tocar a máquina e fazer investimentos.

Por outro lado, se em 2027 a situação já fica insustentável, nos anos seguintes ela se deteriora ainda mais.

Em 2028, a chamada margem líquida para gastos não obrigatórios (que mede o espaço após descontar emendas e pisos) seria negativa em R$ 87,3 bilhões. Há ainda outra maneira de encarar os números: tirando o que fica carimbado para emendas, sobraria apenas R$ 1,6 bilhão para fazer frente a uma necessidade de R$ 88,9 bilhões para cumprir os mínimos de saúde e educação.

Em 2029, não há nem sequer espaço para as emendas. No total, descontando as verbas parlamentares e os pisos, a margem líquida seria negativa em R$ 154,3 bilhões.

Após a repercussão das estimativas, técnicos do governo afirmaram à reportagem, sob reserva, que as projeções podem sofrer mudanças. Há uma percepção dentro do Executivo de que o fim da regra de exceção autorizada pelo STF induziu a ampliação das sentenças judiciais -a conta total chegou a R$ 116 bilhões, como antecipou a Folha de S.Paulo.

Uma previsão ancorada neste ponto de partida estaria, por esse raciocínio, potencialmente inflada. Segundo um técnico, é como se o passado não explicasse necessariamente o futuro.

Segundo os relatos, a equipe econômica abriu uma discussão com a AGU (Advocacia-Geral da União) sobre a possibilidade de que os números verdadeiros sejam menores do que os apresentados -que indicam uma fatura total de R$ 124,3 bilhões em 2027, R$ 132 bilhões em 2028 e R$ 144 bilhões em 2029.

Um dos interlocutores ressaltou, porém, que esse debate sobre a projeção não elimina a necessidade de discutir estratégias para mitigar o problema no futuro.

A solução dada para o impasse sobre os precatórios pode tirar pressão sobre os limites do arcabouço fiscal, mas seus efeitos sobre a dívida pública ainda são uma incógnita.

Nesta terça, as projeções apresentadas pelo governo já indicam um aumento da dívida bruta em relação ao PIB (Produto Interno Bruto). A relação, que ficou em 76,5% do PIB em 2024, ultrapassaria os 80% já no ano que vem e alcançaria o pico de 84,2% do PIB em 2028. Depois, cairia lentamente, mas se manteria acima do patamar de 80% do PIB até 2035, pelo menos.

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